"A NOSSA FORÇA ENCANTADA É MAIOR": RETOMADA ÉTNICA DO POVO AKROÁ-GAMELLA NA LUTA PELO TERRITÓRIO EM URUÇUÍ-PI (1960-2025)
Palavras-Chave: Indígenas Akroá-Gamella; Retomada étnica; Conflitos de terra; Uruçuí-PI; Interdisciplinaridade.
Esta pesquisa analisa os processos de retomada identitária e territorial do povo Akroá-Gamella de Uruçuí-PI, situado na fronteira do Matopiba, região marcada pela expansão agressiva do agronegócio sobre territórios tradicionais. O estudo, construído a partir de um diálogo comprometido com as comunidades indígenas, busca não apenas contestar a narrativa historiográfica que invisibilizou por décadas a presença desses povos no Piauí, mas também evidenciar suas estratégias de resistência frente ao avanço do capital agropecuário, que ameaça suas terras e modos de vida. O trabalho destaca o protagonismo de mulheres indígenas, como o da liderança Maria da Conceição Sousa (Cacica Dan Akroá-Gamella), presidenta da Associação do Povo Indígena Akroá-Gamella (APIAGU), cuja trajetória articula lutas sindicais, movimentos sem-terra e a organização indígena contra a grilagem e a expropriação territorial. As mobilizações dos Akroá-Gamella intensificaram-se a partir dos anos 1990, em um contexto mais amplo de emergência étnica no Nordeste. Em 2005, formalizaram junto à FUNAI a reivindicação pelo reconhecimento étnico, enfrentando simultaneamente a pressão de latifundiários e do agronegócio, que avançam sobre o cerrado.Nesse sentido, um marco histórico fundamental é a Data Santo Antônio (1960), documento que comprova a ocupação ancestral do território antes da grilagem promovida pelas elites locais. A expulsão violenta das famílias indígenas em 1974, seguida por décadas de tentativas frustradas de retomada, revela a persistência dos conflitos fundiários, agravados recentemente pela especulação de terras ligada ao agronegócio. O estudo, ainda, aborda o fenômeno da emergência étnica (Arruti, 1995; Oliveira, 1998) como um processo dinâmico de reafirmação identitária, no qual a luta pelo território se entrelaça com a reconstrução da memória coletiva e organização política do movimento indígena na luta por direitos. A "viagem da volta" (Oliveira, 1998) dos Akroá-Gamella parte da ressignificação do seu passado por meio da luta no presente, resistindo ao apagamento histórico e lutando pelos seus territórios tradicionais. Além disso, este estudo se constitui como uma pesquisa interdisciplinar que articula de forma integrada os referenciais teóricos e metodológicos da Antropologia, História e Geografia, buscando compreender os complexos processos de resistência e retomada identitária do povo Akroá-Gamella. Essa abordagem múltipla permite analisar o fenômeno em suas diversas dimensões - simbólica, histórica e espacial - superando as limitações de uma perspectiva disciplinar singular. Assim, ao combinar fontes orais (depoimentos de Dona Dan e de outros membros da comunidade) e documentais (processos judiciais, registros de conflitos fundiários e matérias jornalísticas), destaca-se a resistência indígena frente à pressão do agronegócio. Além disso, examina como a localização estratégica do território Akroá-Gamella na fronteira do Matopiba amplifica os conflitos, tornando sua luta um emblemático caso de resistência contra a mercantilização de terras tradicionais. Dessa forma, o trabalho não apenas resgata a trajetória de resistência dos Akroá-Gamella, mas também reforça a importância do protagonismo indígena na luta pelo território. Ainda, ao integrar a análise histórica e antropológica, o trabalho demonstra que a luta dos indígenas Akroá-Gamella de Uruçuí constitui uma resistência ativa contra o avanço cada vez maior do agronegócio que ameaça seus territórios e seus modos de vida.